A indústria marítima aumentou a ambição de sua meta climática: em vez de reduzir em 50% suas emissões de gases de efeito estufa até 2050, o setor mira chegar ao net zero até o mesmo ano – ou “por volta” disso.
Depois de negociações em Londres, os 175 Estados-membros da Organização Marítima Internacional (IMO, na sigla em inglês) chegaram a um acordo na última sexta-feira, 7, para acelerar a transição energética.
A descarbonização do setor é considerada particularmente difícil porque, assim como os aviões, grandes navios não podem ser movidos a eletricidade: o peso e a duração das baterias tornam inviável esse tipo de solução. O transporte marítimo é responsável por cerca de 3% das emissões globais de CO2.
Além disso, por conta de sua característica transnacional – também compartilhada pela aviação, o setor marítimo ficou de fora das determinações do Acordo de Paris. As negociações ocorrem no âmbito da IMO, uma agência da ONU.
O acordo prevê pontos intermediários de checagem do progresso em relação à meta net zero. Até 2030 deve haver redução de ao menos 20% das emissões de gases de efeito estufa, mirando em atingir 30%. Dez anos depois, a redução deve ser de pelo menos 70%, em busca de 80%. O ano-base é 2008.
Para apoiar essa trajetória, outro compromisso é de que 5% do uso de energia no comércio por navios seja feito com emissões próximas a zero até 2030. O investimento em novas tecnologias e combustíveis sustentáveis devem auxiliar o processo.
Os grandes cargueiros que transportam cerca de 90% do comércio global hoje queimam um tipo de diesel especialmente sujo. Já estão em desenvolvimento navios movidos a metanol verde, um combustível que pode ser obtido a partir do hidrogênio verde.
O preço do carbono
Apesar do avanço do novo acordo, descrito como “histórico” por algumas partes, ainda serão definidas medidas de caráter técnico e econômico para a transição. A próxima reunião decisiva deve ocorrer em 2025, com as determinações se tornando normas internacionais dois anos depois.
No lado econômico, um dos pontos centrais da reunião era a criação de um mecanismo que determine como o carbono será precificado.
A expectativa era a criação de uma taxa que funcionasse como um imposto sobre o carbono emitido. Os recursos seriam então direcionados para novas tecnologias de eficiência energética.
Mas a medida foi barrada por economias em desenvolvimento, como Brasil, Argentina, África do Sul e Chile, e a discussão foi adiada até 2025. China e Arábia Saudita também se opuseram.
Um dos argumentos para a objeção foi que países mais distantes das grandes economias teriam de pagar mais em função de sua localização geográfica.
Uma proposta em análise, apoiada pelo Brasil, é que se estabeleça um mercado regulado semelhante ao cap-and-trade em vigor na União Europeia. Todos os países teriam metas de redução, e os que as superarem poderiam vender o excedente para quem ficou não atingiu seus objetivos.
Adeus, marca do 1,5ºC?
Mesmo com a nova estratégia da IMO, o comércio internacional não deve conseguir contribuir com os esforços globais de limitar o aquecimento global a 1,5ºC, segundo análises do Conselho Internacional de Transporte Limpo (ICCT, na sigla em inglês).
“Pelas nossas novas estimativas da estratégia revisada, a navegação internacional excederá sua parcela atual do orçamento mundial de carbono de 1,5°C por volta de 2032, mas não irá ultrapassar o nível bem abaixo de 2°C (interpretado como 1,7°C) se seguir o caminho de redução de emissões implícito nesta estratégia revisada”, escreveram o líder do programa marinho do ICCT, Bryan Comer, e a pesquisadora associada, Francielle Carvalho.
Para isso, a meta net zero teria que ser adiantada mais dez anos, de 2050 para 2040.