Pioneira no ecossistema de impacto no Brasil, a Artemisia, que desde 2005 acelera startups, se prepara agora para captar o seu primeiro fundo para investir nesses negócios.
“Nesses anos todos, 700 negócios passaram pela Artemisia e com o tempo percebemos que podemos acelerar, mentorar e ajudar a fazer conexões, mas chega uma hora que falta dinheiro para os negócios se desenvolverem”, diz Luciano Gurgel do Amaral, diretor executivo da aceleradora.
Segundo ele, uma pesquisa feita com os empreendedores para atualizar a proposta de valor da aceleradora mostrou que acesso a capital é crítico para 85% delas.
Mas a resposta para o problema, acredita, não está em um fundo de venture capital de impacto, que forneça capital às empresas. “O campo de investimento de impacto no Brasil é dominado por equity. E faltam fundos de dívida, porque, na estrutura de capital dos negócios, é preciso combinar os dois.”
A ideia já vinha sendo gestada há um tempo e acaba de ganhar um empurrão definitivo. Em dezembro, a Artemisia foi uma das selecionadas pelo BNDES para receber recursos dentro da primeira chamada pública para blended finance.
O banco de fomento vai liberar R$ 90 milhões como capital concessional, ou seja, a fundo perdido, para projetos de instrumentos financeiros. No blended finance, o capital filantrópico entra para absorver os maiores riscos, permitindo a alavancagem dos investimentos com capital comercial.
A proposta da Artemisia é criar um fundo de direitos creditórios (FIDC) para negócios de economia circular, como de gestão de resíduos e reaproveitamento de materiais.
O BNDES investirá nas cotas subordinadas do fundo, justamente aquelas que absorvem a inadimplência inicial, e a ideia é levantar R$ 3 para cada R$ 1 colocado pelo banco.
Gurgel diz que o fundo deve ter prazo de cinco anos e pode captar cerca de R$ 100 milhões, incluindo os recursos do BNDES. Mas a fase de captação ainda deve levar meses para deslanchar. No momento, a aceleradora está em conversas com o banco para concretizar o investimento, o que inclui decidir o valor exato a ser aportado. Só depois disso a Artemisia pretende consultar investidores para entender qual o apetite pelo fundo.
Idealmente, Gurgel gostaria de fazer uma oferta pública, voltada para investidores de menor tíquete de entrada.
“Esperamos que este seja o primeiro veículo de crédito, mas não o último”, diz, deixando no ar que a aceleradora pode enveredar de vez pelo negócio de gestão de fundos. “Falta no Brasil uma casa de renda fixa para negócios de impacto.”
A Artemisia atuará como consultora do fundo, originando as oportunidades de investimento. A securitizadora Vert, o escritório Tozzini Freire Advogados e uma gestora de renda fixa também farão parte da estrutura do FIDC.
Economia circular
A piscina onde o fundo irá buscar as oportunidades já existe. Em parceria com a Gerdau, a Artemisia publicou ao fim do ano passado sua Tese de Impacto Socioambiental em Reciclagem, na qual mapeou 130 negócios que contribuem com a economia circular no país.
Agora, diz, essa base está sendo olhada mais a fundo para a seleção dos ativos. “Esse é um segmento que ainda não está muito desenvolvido no Brasil.”
Cada empresa escolhida não poderá receber mais de 20% do total do fundo, portanto, explica ele, a ideia é ter entre 10 a 20 negócios, que receberão entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões cada.
“Queremos empresas robustas, com teorias da mudança sólidas e que demonstrem capacidade de geração de caixa.” Segundo ele, que fez carreira em bancos antes de se juntar à Artemisia, a análise de crédito que será feita levará em conta principalmente a capacidade de pagamento das empresas e não as garantias apresentadas, como costuma acontecer no sistema financeiro.
Antes de decidir criar o fundo, a aceleradora estruturou aportes de recursos para algumas empresas do seu ecossistema, mas sempre com dinheiro de parceiros. No ano passado, a Artemisia articulou a entrada de Elie Horn, controlador da incorporadora Cyrela, no mundo dos investimentos de impacto. O empresário emprestou R$ 3,5 milhões para duas empresas, a Estante Mágica, que faz a edição e ilustração de livros escritos por alunos das redes pública e privada, e a Barkus Educacional, voltada à educação financeira.