Até o próximo dia 19, cerca de 20 mil pessoas vão passar pelo Palais de Congrès, no centro de Montreal (Canadá), para discutir um assunto urgente, mas que não recebe a atenção devida, nas palavras de ambientalistas e cientistas: a proteção da biodiversidade.
Mais de 1 milhão de espécies animais e vegetais estão ameaçadas de desaparecer da face da Terra, colocando em risco o bem-estar, o sustento e a própria existência dos seres humanos.
Interromper uma perda de vida que só tem comparação com a era dos dinossauros é só um dos objetivos da COP15, a conferência da ONU sobre biodiversidade.
Metade da economia global, ou US$ 44 trilhões, depende de alguma maneira da natureza, de acordo com um cálculo do Fórum Econômico Mundial.
E, é claro, mudança climática e extinção em massa são fenômenos que se retroalimentam. O problema tratado na COP27, realizada no mês passado no Egito, e também suas soluções são inseparáveis.
Preparamos um pequeno guia para entender por que esta COP é importante e o que está em jogo nos próximos dias de negociações em Montreal.
O que é biodiversidade?
Nas negociações internacionais, o termo vai além da definição que se encontra no dicionário.
Na COP15, biodiversidade se refere, por exemplo, à proteção de ecossistemas cuja preservação tem impacto direto na biodiversidade, como é o caso da Amazônia.
O termo também é utilizado para determinar toda diversidade genética do planeta, das baleias azuis às bactérias. Visíveis ou não, esses organismos podem representar a chave para a descoberta de novos remédios, por exemplo.
As negociações tratam do uso justo e da distribuição equitativa dos benefícios obtidos com a diversidade genética do planeta.
O papel das populações tradicionais e indígenas — e seus direitos — são parte essencial das negociações diplomáticas. Embora representem apenas cerca de 5% da população mundial, elas são responsáveis por mais de 80% da biodiversidade do planeta.
Qual a diferença entre a COP15 e a COP27?
COP é a sigla em inglês para “conferência das partes”. Trata-se das reuniões em que são tomadas todas as decisões a respeito de variadas convenções das Nações Unidas.
As mais famosa, é claro, são as da Convenção do Clima, como a
COP27, que aconteceu em novembro, em Sharm el-Sheikh (Egito).
A COP15, que acontece em Montreal (Canadá), é o encontro das partes da Convenção da Diversidade Biológica. Estarão representados 196 países. Apenas dois não ratificaram a convenção: Vaticano e Estados Unidos — os americanos enviaram uma delegação de observadores.
Qual é o objetivo da COP15?
O sucesso da conferência será medido pelo estabelecimento do Marco Global da Biodiversidade pós-2020, conhecido pela sigla em inglês GBF.
O rascunho contém 22 metas práticas, e o que dirá exatamente cada uma delas vai ocupar os negociadores em Montreal pelos próximos dez dias.
Uma das mais importantes é a chamada “30 por 30”: proteger 30% das áreas terrestres e marinhas do planeta até 2030. Outra delas diz respeito à necessidade das grandes empresas medirem e divulgarem seu impacto na natureza.
O marco é frequentemente comparado ao Acordo de Paris para o clima. A expectativa é que, assim como o consenso climático alcançado em 2015, o documento seja um divisor de águas na cooperação global pela preservação da natureza.
Por que a COP15 é importante?
Um dos motivos é o atraso. A última COP da biodiversidade aconteceu em 2018, também em Sharm el-Sheikh.
A COP15 estava originalmente prevista para 2020, na cidade chinesa de Kunming, mas foi adiada repetidas vezes por causa da estrita política do país contra a covid. O governo canadense se ofereceu como anfitrião (formalmente a presidência é dos chineses).
O fato de metas acertadas no passado não terem sido atingidas aumenta a urgência do encontro. Em 2010, no Japão, foram assumidos compromissos para a década seguinte, mas nenhum deles foi alcançado.
Existe o risco de fracasso?
Sim. Alguns falam numa “maldição da COP15”, em referência à reunião do clima de 2009 realizada em Copenhague (Dinamarca) e que acabou sem o resultado esperado.
Apesar de reuniões preparatórias nos meses que antecederam a conferência, incluindo um encontro realizado já em Montreal logo antes da abertura da COP15, restam muitas divergências.
Não há garantia de que todas as metas na versão atual do texto serão adotadas ao final da conferência, em 19 de dezembro, e tampouco se sabe se elas terão a ambição necessária.
E, é claro, o trabalho de verdade começa quando for batido o martelo na plenária final. O documento produzido pelos delegados terá de ser traduzido em ações práticas pelos 196 países que fazem parte da convenção.
Um dos resultados esperados de Montreal é a definição de maneiras para acompanhar o progresso dos compromissos assumidos.