
Diante da necessidade de escalar o financiamento climático dos bilhões para os trilhões, a filantropia mundial tem buscado novos caminhos e jeitos de atuar para aumentar o impacto dos seus milhões colocados em projetos.
A centenária Fundação Rockefeller avalia que funcionar como avalista de credibilidade pode ser um deles – e assim atrair investidores para iniciativas climáticas e inclusão de comunidades na economia verde, seu foco de atuação mais recente.
“Não buscamos apenas financiar, mas entender como diferentes capitais se combinam para gerar impacto real”, afirma Lyanna Latorre, vice-presidente para a América Latina e Caribe da fundação. “O nome Rockefeller carrega peso. Ele chama atenção para organizações sérias e ajuda a destravar capital. Não operamos empresas nem acompanhamos fundos, mas nosso apoio sinaliza confiança.”
A organização definiu recentemente cinco caminhos para reorientar sua atuação em escala global: mobilização de capital para riscos iniciais, o fortalecimento de modelos comunitários, o apoio a tecnologias acessíveis, a construção de parcerias com governos e a profissionalização da filantropia.
O Brasil tem ganhado relevância e hoje é o centro da estratégia para a América Latina. “Estamos trabalhando muito aqui porque o Brasil se tornou um celeiro de boas práticas socioambientais”, afirma Latorre.
Ela cita sistemas de alimentação saudável, arranjos produtivos locais e iniciativas de restauração florestal entre os exemplos que atraíram a atenção da instituição. Na prática, isso se traduz em projetos como o Instituto Makarapy, que a fundação apoia no Maranhão. A entidade promove cadeias produtivas sustentáveis em territórios indígenas. A fundação também apoia iniciativas de restauração florestal em escala, como a da Mombak.
O aporte realizado na startup de reflorestamento há quase dois anos é a materialização desse novo caminho. A Mombak gera créditos de remoção de carbono por meio do reflorestamento de áreas degradadas da Amazônia. O cheque de US$ 5 milhões da Fundação Rockefeller chegou após uma auditoria extensa e ajudou a trazer outros US$ 30 milhões do fundo de pensão canadense CPPIB.
“A fundação tem experiência em investimento de impacto e a barra deles é alta, o que dá apoio à nossa tese de remoção de carbono com alta integridade [qualidade]”, disse o cofundador da Mombak, Peter Fernandez, à época do aporte.
Posição do Brasil
A mais recente doação anunciada no Brasil foi durante a COP30: R$ 29 milhões para projetos de agricultura regenerativa, em uma leitura de que o Brasil pode acelerar modelos escaláveis para outras regiões. O recurso será destinado a 12 organizações municipais que trabalham com a transição agroecológica e conectam pequenos produtores ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
O foco em clima é recente na Fundação Rockefeller. Criada pelo magnata John D. Rockefeller em 1913, foi no Brasil que a instituição realizou sua primeira experiência fora dos Estados Unidos, em 1920, apoiando campanhas de saúde pública voltadas ao combate de doenças – em uma época em que o movimento sanitarista no país tinha relações com o eugenista.
A fundação não divulga o orçamento individual de cada região em que atua. Apenas o quanto doou nos pouco mais de 100 anos de história: US$ 24 bilhões desde 1913.
Dentro dos cinco caminhos que a Fundação Rockefeller quer percorrer, o Brasil apresenta muitos dos requisitos da agenda: atores públicos que enxergam a bioeconomia como política de Estado, empresas que buscam métricas de impacto e organizações sociais com capilaridade local, segundo Latorre.
“Estamos olhando para o Brasil como plataforma de aprendizado e de demonstração”, diz a vice-presidente.
Latorre destaca uma mudança perceptível na região: governos subnacionais passaram a ocupar um papel mais ativo na agenda socioambiental, com compromissos mais claros e um entendimento crescente de que políticas públicas só funcionam quando são construídas de baixo para cima, a partir das necessidades e vozes das comunidades.
Outra agenda em que o país saiu na frente, segundo a executiva, é o blended finance, modelo em que o dinheiro catalítico (filantrópico ou subsidiado) entra para reduzir custos ou mitigar riscos, atraindo recursos privados em maior escala. Para Latorre, esse é um dos futuros possíveis da filantropia.
“O Brasil entendeu que esses capitais não precisam atuar de forma paralela, mas combinados. Cada um cumpre um papel e reduz o risco do outro”, afirma.